O outono é conhecido na América do Norte como a estação da queda das folhas, daí o apelido de "Fall". Os animais se preparam para hibernar estocando grãos e comendo o máximo que podem ou imigrando para o sul. Similarmente na lavoura o outono é época de estocagem dos alimentos que serão consumidos durante o inverno. A velha técnica de temperar e salgar as carnes, de fazer compotas, doces, picles, salames, queijos, molhos, etc. nasceu desta necessidade de conservar os alimentos para consumí-los durante a estação estéril. Estranhamente, hoje são os alimentos processados e em conserva os que ocupam a maior área de exposição nos supermercados, até mesmo em regioes onde o inverno praticamente não existe.

Além da cultura alimentar, o ritmo da natureza impregnou também nossa cultura e o modo de compreender a existência. Não é por acaso que a festa dos mortos, ocorre no meio do outono e que o inverno ainda guarda a conotação de etapa final da vida. Do mesmo modo a festa das colheitas, que é uma festa de desafio à morte e de confiança no futuro, marcava o fim do trabalho de estocagem e a preparação para os meses mais frios. Estes dois exemplos de eventos culturais tradicionalmente pagãos, ou seja, "paisanos", das comunidades agrícolas foram sincretizados pela religião dominante e convertidos em Dia de Finados e Natal. Estas festas tradicionais (talvez o Natal mais do que Finados, Páscoa, ação de graças, dia dos pais, dia da criança, etc.) constituem um dos eixos da estratégia de marketing: a publicidade visa convencer de que para se integrar socialmente é preciso participar da festa e consumir determinados símbolos. Quem não consome não participa da festa, e quem não participa da festa está socialmente à margem.

Antes da revolução industrial, o ritmo da paisagem local condicionava fortemente a organização da sociedade. Neste contexto, os trabalhos de prevenção eram geralmente feitos em corvéia, o que exigia solidariedade e cooperação. Assim, imaginamos que o nível de coesão social constituía uma condição cultural fundamental para a sobrevivência. Após a revolução industrial e o consequente processo de urbanização, a cultura e a religião (re-ligare) se desvincularam dos ritmos naturais assumindo significaçoes cada vez mais abstratas, geralmente com valores de auto-estima e reconhecimento social atribuídos à posse de bens de consumo. O valor de status atribuído à marca de um produto substituiu até mesmo o valor prático em função da utilidade à melhora da qualidade de vida do usuário.

Talvez isto ajude a explicar o que podemos chamar de alienação cultural com relação à terra e à natureza, esta alienação que dificulta a reação coletiva e organizada contra os enormes problemas ambientais que atingem o planeta.

Neste sentido, a conservação de áreas verdes urbanas, mesmo que pareça apenas uma maquiagem da cidade e um mascaramento dos problemas ambientais que ela produz, constitui um elemento de reconciliação entre cultura urbana e natureza e um desencadeador de reaçoes eficazes contra a degradação da qualidade de vida como degradação do ecossistema local e planetário.